terça-feira, 30 de março de 2021

EU QUERIA ACREDITAR - POR OTÁVIO SANTANA DO RÊGO BARROS

 


Até o otimista mais inveterado está agoniado com os rumos que singramos neste mar de insensatez e hipocrisia que desfigura a dividida sociedade brasileira.

Na terça-feira (23.03.2021), após sete anos de um rumoroso processo, cercado de todo tipo de interesse e revirado pelo avesso na opinião pública, com indiciamento, denúncia, condenação e cumprimento da pena pelo réu, a corte suprema encontrou motivos para considerar a tramitação processual tecnicamente incorreta.

Segundo aquele soberano tribunal, teria ocorrido um equivocado ato administrativo. Anule-se, pois, tudo. É como se nada do que foi realizado houvesse acontecido. 

As centenas de milhares de papéis (terabytes de dados arquivados em servidores) contendo investigações, diligências, apreensões, oitivas, acareações, recursos, agravos, sentenças, prisões - isso não aconteceu?

As demandas das bancas de advogados contratadas a peso de ouro para encontrar filigranas jurídicas que inviabilizassem o processo - isso não aconteceu?

O réu passou 580 dias encarcerado por decisão judicial confirmada em todas as instâncias recursais, até na própria corte suprema - isso não aconteceu? 

Empresários, políticos, funcionários públicos, empresas, consórcios graciosamente devolveram bilhões de reais surrupiados dos cofres públicos. Crimes confessados a centenas nas delações premiadas, instrumento eficaz de combate à corrupção - isso não aconteceu? 

A canetada que promoveu a anulação dos atos, promoveu também um tsunami na corrida eleitoral de 2022, ao fazer ressurgir do ostracismo mais um candidato em condições de enfrentar o atual mandatário. Mas deixa sem resposta o estrago da decisão pretérita que impediu o então ficha suja de concorrer ao pleito anterior. O que certamente mexeria nas composições partidárias.

Não dá para acreditar.

Cinéfilo que sou, viajo em um roteiro ficcional. Nessa hipotética película, a justiça devolveria os autos às partes com uma chave para a ignição da máquina do tempo (como em “De volta para o futuro”, filme estrelado por Michael J. Fox) que levaria os envolvidos ao passado, culpados ou inocentes, para reconstruírem a verdade conforme O Grande Irmão determinasse.

Afinal, como na icônica obra 1984 de George Orwell, se o passado não agradou, se reconstrói. Há sempre especialistas nas linhas de produção do recontar a história. E se esse novo passado não for do agrado, reescreva-se outra uma vez!

Paz e Bem!

Otávio Santana do Rêgo Barros

General de Divisão R1

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