Aproveitei a última semana para assistir à badalada minissérie Gambito da Rainha. Trata-se de uma trama em torno do tabuleiro de xadrez, com personagens mergulhados em problemas existenciais, tendo como pano de fundo a guerra fria e o domínio da opinião pública mundial.
A história nos revela a enxadrista Elizabeth Harmon, órfã de mãe, abandonada pelo pai, crescer em um orfanato conservador de Kentucky, nos Estados Unidos, onde aprendeu os primeiros movimentos do “jogo dos reis”, com um simples faxineiro. Dos porões do orfanato até os salões de um suntuoso palácio em Moscou, pouco mais de dez anos.
Harmon suportou inúmeras adversidades, envolveu-se com drogas, perdeu a mãe natural em acidente de carro e a mãe adotiva para a bebida.
No entanto, o que a caracteriza marcadamente é a sua perseverança e a sua capacidade de se concentrar para vencer os vários problemas diante do tabuleiro, potencializados pelo implacável ponteiro do relógio.
O maior deles, enfrentar Vassíli Borgov, campeão mundial de xadrez, russo, e toda a estrutura no entorno do jogador cuja missão era protegê-lo, impedindo que uma mulher, ocidental, democrática, ianque e jovem, pudesse suplantá-los.
Vivia-se a guerra fria em seu momento mais quente.
Quais experiências desta película poderíamos tomar para nos ajudar a vencer os desafios contemporâneos materializados na Covid-19?
Tenho sido insistente em meus artigos na abordagem dessa temática. Não compreendo a razão de tantos desentendimentos entre as autoridades, entre os órgãos reguladores da saúde, entre as empresas (instituições) pesquisadoras da vacina e, até, entre camadas da própria população. O que é mais importante que a vida?
No filme, Harmon recusa apresentar-se para o mundo em um papel conservador baseado em apoios religiosos de entidades cristãs norte-americanas. Não fica claro se o fez por não apoiar a causa, ou por não querer se deixar envolver em arengas que nada contribuiriam para o seu objetivo: vencer o campeonato mundial de xadrez.
Não defendo que os políticos se olvidem de suas posições ideológicas. Defendo que as use em benefício da sociedade e dos direitos que cada indivíduo conquistou ao longo de sua existência.
No momento derradeiro, quando Harmon enfrentava o seu mais temido adversário, Borgov, todos os seus amigos, e até mesmo adversários, cientes da gravidade do momento, se uniram para encontrar as soluções possíveis diante das variantes do tabuleiro. E venceram!
“Coalizações mais efetivas são aquelas que reúnem grupos com opiniões diferentes – mesmo opostas – sobre muitas questões.” Destaco essa passagem da obra COMO AS DEMOCRACIAS MORREM (Levitsky & Ziblatt) para demonstrar como se faz importante a união neste momento pandêmico. A Harmon conseguiu esse feito! Nós conseguiremos?
Permitam-me continuar martelando as pedras da hipocrisia, da vaidade e da insensatez que vêm preenchendo o ego desses jogadores (ir)responsáveis pela busca de solução contra os malefícios da Covid-19. Não posso admitir que esses atletas entrem nas competições e se contentem em logo se declararem derrotados. Nem sequer tentarem.
Se o Brasil não vai se classificar para as finais do campeonato mundial de combate ao coronavírus, mantendo-se refratário aos indícios científicos cotejados, é por culpa dos grandes-mestres que não tiveram foco, não estudaram os adversários e não quiseram a ajuda de outros enxadristas. Alguma dúvida?
Finalizo, sempre com esperanças! No filme, Borgov, nunca antes derrotado, aceita com humildade, serenidade e cortesia a derrota avassaladora que lhe foi imposta por Harmon e, de forma simbólica, entrega o seu rei nas mãos da jovem vencedora.
Sempre será possível a conciliação. Eu acredito!
Um Ano Novo com mais esperanças.
Paz e bem!
Otávio Santana do Rego Barros
General e ex-porta-voz da Presidência da República.
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