quinta-feira, 30 de julho de 2015

JF amarga prejuízos com perda de eventos

Juiz de Fora segue com o desafio de consolidar o setor de turismo. Destacada com potencial para eventos, enfrenta a ausência de um plano diretor atualizado para a prospecção de novas atrações e a dificuldade de manutenção daquelas que se tornaram tradicionais. Desde 2012, houve a perda de edições do Miss Brasil Gay e do Minas Láctea, e, este ano, o Festival Internacional de Música Colonial Brasileira e Música Antiga, que estaria dando fôlego à economia neste mês, não está sendo realizado. O evento foi transferido para novembro e terá o formato reduzido. Além da perda cultural, há o prejuízo econômico. Juntas, estas três atrações movimentam cerca de R$ 220 milhões e aquecem setores diretos e indiretos da economia.
Registrado como patrimônio imaterial de Juiz de Fora, o Festival de Música foi realizado durante 25 anos de forma ininterrupta em julho, aproveitando o período de férias escolares, já que o evento atrai um grande público de estudantes, e muitos são de fora da cidade. A programação incluía concertos, exposição, encontro de musicologia e cursos durante duas semanas. A média de espectadores era de 80 mil pessoas. Na última edição foram recebidas 700 inscrições de alunos para a participação em 36 cursos.
No período do festival, a ocupação da rede hoteleira chegava a 70%, e o faturamento de bares e restaurantes aumentava até 45%, conforme informações do Sindicato de Hotéis, Restaurantes, Bares e Similares (SHRBS). O coordenador-executivo da entidade, Rogério Barros, explica que o público do evento também era responsável por aquecer o comércio. Para ele, o festival “é um dos maiores divulgadores da cidade como produto turístico para o país e o mundo”. Segundo dados da organização que estava à frente do evento, até então, ele injetava, em média, R$ 600 mil por dia na economia local.
O festival era organizado pelo Centro Cultural Pró-Música que, em 2011, foi incorporado à Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). A incorporação foi efetivada no final do ano passado e, este ano, o evento acontece totalmente sob a responsabilidade da universidade. Pela dificuldade na captação de recursos, o festival teve a data de realização alterada para novembro, e o período de duração, encurtado para uma semana. A expectativa de público e a programação não foram divulgados pela nova organização.
Cancelado de novo
Também registrado como patrimônio imaterial, o Miss Brasil Gay chegou a 36 edições. Em 2012, foi cancelado por falta de patrocínio, mas conseguiu ser retomado no ano seguinte. Em 2014, os problemas financeiros novamente impediram a realização do evento, que também não acontecerá este ano. Tradicionalmente realizado em agosto, nesta época do ano também era comum ver a movimentação para os preparativos do evento.
O Miss Brasil Gay atraía, em média, 12 mil pessoas e era responsável pela ocupação de quase 100% da rede hoteleira. “O retorno é tão bom para o nosso setor que ajuda a salvar o mês que, em média, tem ocupação entre 30% e 40%”, informou Rogério Barros. Ele ressalta que o público do evento tem alto poder aquisitivo, o que também contribui para o aumento do consumo em bares, restaurantes e comércio.
Levantamento feito pela Embratur apontou que o turista gay tem gastos até 30% superiores com despesas em cultura e arte, lazer, entretenimento e vida noturna. “O Miss Brasil Gay é um divisor de águas no que se refere à luta contra a homofobia, em função de ser pioneiro no segmento e no que tange ao desenvolvimento do turismo, pois todos os componentes do trade turístico se beneficiam”, diz o turismólogo e um dos organizadores, Leonardo Becker. “O evento só não era mais lucrativo em função da falta de um turismo organizado na cidade.”
Também em 2014, o Minas Láctea, considerado o principal evento laticinista da América Latina, não aconteceu. Segundo a Empresa de Pesquisa Agropecuária de Minas Gerais (Epamig), organizadora do evento, o cancelamento ocorreu em função de inviabilidade de parceria com a iniciativa privada e da realização da Copa do Mundo e das eleições. Em 2013, o evento registrou presença de 14 mil pessoas, alta de 16% ante ao ano anterior, e movimentou cerca de R$ 200 milhões em negócios. A retomada este ano apresentou números menores, com dez mil participantes e movimentação em torno de R$ 100 milhões.
O evento é considerado o melhor para a rede hoteleira e gastronômica. “Os hotéis ficam lotados, em alguns casos são locados, e os restaurantes têm aumento de, pelo menos, 50% no faturamento”, diz Rogério. Segundo ele, a não realização do Minas Láctea contribuiu para o fraco desempenho do setor hoteleiro. “O ano passado foi o pior dos últimos cinco anos.”

Falta de ações integradas agrava situação

Está prevista para setembro uma audiência pública na Câmara Municipal que irá discutir o setor de turismo na cidade. O encontro foi marcado após a presidente do Conselho Municipal de Turismo, Danielle Feyo, solicitar o apoio do Legislativo durante participação na tribuna livre. “Precisamos de ações integradas para fortalecer o setor.” Reiterando que a consolidação do turismo será responsável por atrair investimentos e aumentar o emprego, a renda e a arrecadação do município, ela afirma a necessidade de criação de um novo plano diretor. “Tivemos um plano estratégico há 15 anos, mas suas ações foram descontinuadas.”
Na análise de Danielle, a falta de diretrizes agrava as dificuldades do setor. “A proposta do Conselho é atualizar este plano antigo até o final do ano para validarmos o direcionamento das nossas ações. Feito isso, pretendemos trabalhar na criação de um plano municipal de turismo.” Ela destaca que, desta forma, será possível prospectar novos eventos para a cidade. Sobre a dificuldade em manter aqueles que são tradicionais, ela atribui que “fatores externos” prejudicaram a realização das edições do Miss Brasil Gay, Minas Láctea e Festival de Música.
Na avaliação do doutor em sociologia e professor do curso de turismo da UFJF, Marcelo do Carmo, a perda de eventos tradicionais é muito mais prejudicial do que a dificuldade em atrair novos eventos. “A gente vai matando o que é antigo e, desta forma, o patrimônio, a cultura e a nossa identidade se esvaem.” Ele também questiona a vocação dada para Juiz de Fora para este segmento. “Somos uma cidade com potencial para eventos, mas que não permite a operacionalização dos mesmos. As burocracias são muitas, e os nossos clubes e escolas não são liberados para atividades. Também não há uma aproximação com a iniciativa privada para garantir recursos”, pontua.
O especialista também defende a estruturação de diretrizes para o setor. “Para começar, deveríamos estudar a real vocação turística da cidade”, afirma. “Na área de eventos, precisamos nos preocupar em preservar a tradição que temos antes de atrair novos. Afastar questões religiosas e enxergar os eventos como patrimônios culturais e oportunidades de negócio.”
http://www.tribunademinas.com.br/jf-amarga-prejuizos-com-perda-de-eventos/

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