quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Fraude no Correios tinha até clube da propina, revela contabilidade da quadrilha


Escândalo de fraudes derrubou o diretor regional do Correios no Rio Omar de Assis Moreira
Escândalo de fraudes derrubou o diretor regional do Correios no Rio Omar de Assis Moreira Foto: Reprodução

Flávia Junqueira e Cíntia Cruz


A Polícia Federal encontrou a contabilidade da quadrilha que causou um prejuízo de mais de R$ 7 milhões aos cofres do Correios, entre agosto de 2011 e abril de 2013. Na casa de um dos envolvidos no esquema de fraudes no plano de saúde da estatal, havia uma agenda com a divisão do dinheiro desviado por meio de cirurgias superfaturadas — algumas nunca realizadas.

Nas anotações feitas à mão, do valor da nota fiscal enviada à Gerência de Saúde do Correios, subtraía-se o imposto a ser pago. O saldo era dividido entre médico, empresa de material cirúrgico e o que eles chamavam de “grupo dos 8”. Dependendo do hospital, o “lucro” era repartido pelo “grupo dos 6”. Numa única cirurgia, cada integrante chegava a receber R$ 6.300.

A agenda foi apenas um dos documentos recolhidos pela PF, na manhã desta quarta-feira, durante o cumprimento de oito mandados de busca e apreensão nas residências de sete envolvidos no esquema de corrupção e no Hospital Espanhol. Na última sexta-feira, a PF já havia cumprido mandado na casa do diretor regional do Correios no Rio Omar de Assis Moreira, afastado do cargo por decisão judicial. Ele teve os bens bloqueados.
A PF realizou busca e apreensão no Hospital Espanhol, no Centro do Rio
A PF realizou busca e apreensão no Hospital Espanhol, no Centro do Rio Foto: Thiago Lontra / Extra
De acordo com o delegado da PF Lorenzo Martins Pompílio da Hora, que conduziu as investigações, “foram obtidos fartos elementos de prova relacionados ao esquema criminoso que causou prejuízo milionário ao Correios. O trabalho continua com a análise do material arrecadado hoje nas buscas e apreensões realizadas”.
Notas fiscais emitidas pelo Hospital Balbino, em Olaria, e pagas pelo Correios estão sendo investigadas
Notas fiscais emitidas pelo Hospital Balbino, em Olaria, e pagas pelo Correios estão sendo investigadas Foto: Fábio Guimarães
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), o esquema era articulado por Daniel de Melo Nunes e o médico Carlos Alberto Alonso, que negociavam privilégios para hospitais no Rio, com o aval do diretor regional e do ex-gerente de Saúde da estatal Marcos da Silva Esteves. Nove pessoas já foram denunciadas e, nas próximas semanas, outras seis serão alvo da investigação.

— Os empregados públicos permitiram a antecipação de pagamentos para esses hospitais e, em troca, Omar e Marcos receberam, cada, R$ 144 mil — disse o procurador Sérgio Luiz Pinel Dias.
Operação da PF fez busca e apreensão na casa do ex-gerente de Saúde do Correios Marcos Esteves, no Condomínio Suíça Carioca, em Jacarepaguá, em maio deste ano
Operação da PF fez busca e apreensão na casa do ex-gerente de Saúde do Correios Marcos Esteves, no Condomínio Suíça Carioca, em Jacarepaguá, em maio deste ano Foto: Fábio Guimarães / Extra
Esquema de fraudes foi revelado pelo EXTRA

O esquema de fraudes, revelado pelo EXTRA em agosto de 2013, além de superfaturar o pagamento de cirurgias elevou os valores das tabelas de diárias e taxas pagas a alguns hospitais, bem como pagou por serviços não prestados, que eram lançados como se fossem devoluções de valores estornados pelo plano de saúde do Correios.

O MPF denunciou os funcionários públicos Omar Moreira e Marcos Esteves, além de Daniel de Melo Nunes, Luciano Sampaio Balbino (representante do Hospital Balbino), Paulo Maurício Fernandes de Oliveira, Arnaldo Gama Arzua Alves Barbosa, Júlio Teixeira Ramos (representante do Hospital Espanhol), Carlos Alberto Alonso Filho e Nivaldo Lopes de Oliveira Neto.

O Correios respondeu que o caso vem sendo apurado pela empresa, com apoio da PF, desde 2013, e que Omar Moreira foi quem solicitou a investigação. Em nota, a empresa afirma que Moreira também instaurou processo de sindicância interno e constituiu grupo de trabalho para apoiar a apuração da PF. Denúncia sobre o caso foi encaminhada ao Ministério Público Federal, em setembro de 2013, pela Administração Central dos Correios em Brasília. “A sindicância interna a respeito dos fatos, conduzida atualmente por órgão corregedor dos Correios em Brasília, está em fase final e é acompanhada pela Controladoria Geral da União (CGU).”
O ex-assessor da direção regional do Correios João Maurício Gomes da Silva, o Janjão, foi exonerado do cargo
O ex-assessor da direção regional do Correios João Maurício Gomes da Silva, o Janjão, foi exonerado do cargo Foto: Reprodução
Delação premiada
Em depoimento prestado ao Ministério Público, o ex-assessor da diretoria do Correios, João Maurício Gomes da Silva, o Janjão, denunciou o esquema de corrupção no plano de saúde da estatal. Após ser exonerado do cargo, no ano passado, ele fez um acordo de delação premiada em troca de redução de pena. A informação foi divulgada pelo “RJTV”, da Rede Globo.

No depoimento, Janjão afirma que o então diretor regional do Correios, Omar de Assis Moreira, deu sinal verde para início do esquema. Ainda segundo ele, cada um dos integrantes do grupo recebia R$15 mil, mas o valor foi diminuído nos meses seguintes. No documento, ele relata que Omar chegou a reclamar da redução.

O ex-assessor também afirma que a última vez que entregou dinheiro a Omar foi em maio de 2013. Ele disse que um dos pagamentos foi entregue em um posto de gasolina no final da Linha Amarela, via expressa que cruza a cidade. Janjão contou que os encontros para os pagamentos ocorriam na última semana do mês ou início do mês seguinte.

Acusados respondem

Procurada, a direção do Hospital Balbino negou as acusações. Segundo o advogado que representa o hospital, Ricardo Pieri, a Polícia Federal fez, em maio, uma apreensão de documentos que comprovam que todos os serviços foram prestados e justificam os pagamentos realizados. Pieri acrescentou que “recebeu com surpresa” a existência da delação premiada. A nota do hospital conclui que o fato de ainda não ter tido acesso ao documento em questão “inviabiliza pronunciamento mais detalhado”.

Afonso Destri, advogado de Omar de Assis, também garantiu que seu cliente é inocente. Segundo ele, João Maurício Gomes da Silva, ex-assessor de Omar, que citou o antigo chefe em depoimento, foi exonerado por ter sido flagrado “praticando ilicitudes”. O advogado afirma ainda que Omar “tem décadas no Correios sem nenhum deslize”.

Marcos Esteves, Nivaldo Lopes de Oliveira Neto, Arnaldo Gama Arzua Alves Barbosa, Carlos Alberto Alonso Filho e Daniel de Melo Nunes não foram localizados pelo EXTRA.
Paulo Maurício Fernandes de Oliveira afirmou “não ter nada a ver com isso”, e não quis se pronunciar. Já Júlio Teixeira Ramos, por meio do advogado Francisco Ortigão, informou que não foi notificado ou citado, e que portanto “não tem nada a declarar”.


http://extra.globo.com/casos-de-policia/fraude-no-correios-tinha-ate-clube-da-propina-revela-contabilidade-da-quadrilha-14611022.html#ixzz3JbmTdjJq

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