22 de Setembro de 2013 - 07:00
Comércio e artesãos encerram atividades mais cedo, enquanto Fórum e Câmara aumentam vigilância e Igreja é cercada
Por MICHELE MEIRELES
"O coração de Juiz de Fora está infartando." A afirmação de uma artesã que trabalha no Parque Halfeld revela o quadro do principal espaço público do município. Localizado entre os prédios dos poderes Legislativo e Judiciário, um dos símbolos da cidade se tornou área de livre comércio de drogas e sinônimo de insegurança. Os reflexos dos problemas já mudaram a rotina do parque e do entorno. A feira de artesanato que ocorria aos domingos acabou, comércios da área fecham as portas mais cedo, o parquinho, apesar de ter sido reformado, é pouco frequentado por crianças, a Câmara Municipal agora tem esquema de segurança na entrada, e a Igreja São Sebastião, em frente ao parque, foi cercada. No último dia 6, as grades do Fórum Benjamin Colucci foram fechadas depois de uma briga de gangue.
Comerciantes, taxistas e moradores relatam que, além do tráfico de drogas, conflitos de galeras, assaltos, prostituição e atos obscenos ocorrem em plena luz do dia. As próprias autoridades responsáveis pela segurança reconhecem o uso do espaço para práticas ilícitas. Intimidada com a ousadia dos infratores, a população tem evitado utilizar o principal cartão postal de Juiz de Fora.
De acordo com o diretor do Fórum Benjamin Colucci, juiz Edir Guerson, a medida extrema de fechar os portões do prédio será tomada todas as vezes em que ocorrer "alguma anormalidade na área. Não tem outro jeito, vamos fechar as grades. Hoje estou com um policial militar e dois guardas na porta. Em outubro, cinco policiais ficarão aqui. Depois que a vigilância eletrônica for instalada, em até 120 dias, vamos fazer a identificação e revista de todos que acessarem o espaço."
O magistrado destacou que há uma preocupação com a situação do parque e que problemas no espaço desencadeiam outros no interior do Fórum. Em fevereiro deste ano, um grupo invadiu o local brigando. "Não tem como controlar o que acontece da porta para fora, mas preocupa a todos nós. É claro que há reflexos aqui dentro, como as brigas, cujos participantes correm para cá para fugir ou se esconder," destacou o juiz.
Alterações
A colocação de grades na Igreja São Sebastião, iniciada há cerca de um mês, também é resultado da falta de segurança no parque. Segundo a assessoria da Arquidiocese de Juiz de Fora, além do gradeamento, está prevista a colocação de cerca viva. A medida visa a resguardar o templo, que passa por processo de restauração. "A proteção é necessária para evitar futuros atos de vandalismo na fachada e também por conta da presença de pessoas que fazem uso de drogas no terreno da igreja - também observado no Parque Halfeld, muito próximo à igreja - e a prática de prostituição", informou a assessoria, por meio de nota.
Também houve alterações na rotina no prédio da Câmara Municipal. Um dos motivos da presença de um policial militar e de seguranças na porta do Palácio Barbosa Lima para controlar o fluxo de entrada está relacionado com os problemas do Parque Halfeld. No último dia 12, por volta das 21h30, um grupo de 14 jovens se enfrentou no parque. Depois de entrar em luta corporal, parte dos envolvidos correu em direção ao prédio do Legislativo.
De acordo com o presidente da Câmara, Julio Gasparette (PMDB), antes do controle, iniciado em julho, muitas pessoas que ficavam no parque iam para o prédio, onde causavam incômodos. "Já houve discussão entre gangues aqui dentro. Com as mudanças, é mais difícil que isto aconteça." De acordo com o vereador, a preocupação com a segurança no Parque Halfeld é antiga e piora a cada dia. "No meu primeiro mandato, propus que o parque fosse gradeado e ficasse aberto entre 6h e 18h. Acho que iria melhorar. Hoje vejo cada coisa lá, droga, então, está cada vez se disseminando mais."
No entanto, para o presidente do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB), núcleo Juiz de Fora, Marcos Olender, o gradeamento não resolveria os problemas do espaço. "Praças são espaços que têm que ser abertos, livres. Se forem cercados, as pessoas passam a ter medo de entrar, intimida. Se acontece algo dentro das grades, só há uma saída." Na avaliação dele, as soluções para o Parque Halfeld viriam com a colocação de iluminação pública de qualidade, com boa ocupação e boa política de segurança. "O Poder Público tem que dar ao cidadão condições de usufruir dos espaços abertos", finaliza.
'Ficamos à mercê de tudo aqui'
"Deixamos de vir trabalhar aos domingos por falta de segurança. Ficamos à mercê de tudo aqui. Já encaminhamos um ofício à Câmara Municipal, pedindo mais segurança. Está difícil, quase não vendemos. As pessoas evitam frequentar o Parque Halfeld", diz a presidente da Associação dos Artesãos do Parque Halfeld, Marisa Ferreira. Segundo ela, durante os dias da semana, as expositoras decidiram deixam a tenda por volta de 16h. Antes, elas permaneciam até as 18h.
Um dos maiores problemas do Parque Halfeld, segundo comerciantes e frequentadores, é o tráfico. A prova de que a movimentação ocorre no espaço são as recentes operações policiais que culminaram com apreensão de tóxicos e prisão de suspeitos. No dia 5 deste mês, a PM apreendeu três porções de maconha com um homem de 28 anos. Já em 20 de agosto, um rapaz de 18 anos foi preso e dois adolescentes de 17, apreendidos pela Delegacia Especializada Antidrogas, depois de serem flagrados vendendo drogas na área. O trio aproveitava a circulação de pessoas para "comercializar" entorpecentes. Com eles, os policiais apreenderam 70 pedras de crack, uma porção bruta da mesma substância, buchas de maconha e R$ 44.
Segundo o inspetor Rogério Marinho, a equipe da Especializada já havia recebido denúncia sobre a situação na área pública. Em abril, um adolescente, 14, foi apreendido pela PM após ser flagrado com seis buchas de maconha. Em março, em um intervalo de uma semana, cinco adolescentes foram apreendidos pelo mesmo problema no Parque Halfeld. Em um dos casos, militares perceberam a movimentação e viram que um dos suspeitos buscava algo nos canteiros.
Nos últimos dias, a Tribuna observou a movimentação de grupos na área. No dia 6, uma sexta-feira, por volta das 14h30, uma turma de pelo menos dez adolescentes estava em um dos bancos, em frente à Rua Santo Antônio. Quando perceberam a presença da reportagem, alguns tentaram intimidar e gritaram: "Filma nóis fumando maconha." Meia hora mais tarde, cinco jovens se reuniram no quiosque. Um deles entregou uma substância às garotas, que manusearam o produto e depois fumaram juntos. Pouco tempo depois, mais três se juntaram ao grupo. A Tribuna flagrou ainda a venda de bebida alcoólica em uma barraquinha do parque.
Em três dias da última semana, a movimentação observada foi a mesma: grupos se reúnem no banco próximo à área de jogos, depois descem e se concentram no quiosque, onde acendem cigarros preparados no local. Em um dos flagrantes, dois jovens negociam droga sem se preocupar com quem está próximo. "Você tem de quanto aí?", pergunta um. O outro responde: "De todos os preços." Em seguida, ele entrega um invólucro e recebe o dinheiro do comprador.
"O tráfico aqui é todo dia, o dia todo. Isto traz confrontos entre grupos e medo. Quem está errado são eles, e quem perde somos nós", desabafa um jovem. Um homem que trabalha no local há 15 anos relata que a situação piora diariamente. "Percebo que o tráfico cresce e, cada dia mais, as pessoas evitam estar aqui. Antes era um espaço democrático. Hoje acabou."
De acordo com o inspetor Rogério Marinho, o comércio de entorpecentes na área vem sendo monitorado. Segundo ele, a equipe adotou a divisão da cidade em pontos que vêm sendo constantemente monitorados. "No que se refere ao Parque Halfeld, estamos recebendo denúncias e verificando cada uma delas. Nosso trabalho é identificar os vendedores de drogas, para, posteriormente, efetuar as prisões."
Segundo o comandante da 30ª Cia da PM, capitão Marcelo Monteiro de Castro, a corporação tem feito ações no local e tendo "atuações positivas, dando uma resposta a contento, fazendo a prisão de autores de tráfico e apreensão de drogas". Ele afirma que há policiamento efetivo no parque. Na avaliação do comandante, "o Parque Halfeld é um lugar excelente para ir e muito tranquilo".
'Quem perde somos todos nós'
Todas as pessoas ouvidas pela Tribuna foram enfáticas ao dizer que falta segurança pública no parque. Comerciantes, frequentadores, taxistas e moradores acreditam que a presença e ações repressivas de forças policiais podem ajudar a sanar o problema. "Quando tem confusão, os guardas vão para o outro lado. Sobre o tráfico, fingem não ver. Entendo o lado deles, como duas ou três pessoas vão controlar isto?", questiona um comerciante. Uma artesã classifica o quadro como "um assassinato ao lazer público. Não é possível que ninguém vê o que acontece aqui, no meio do Centro. Cadê o Poder Público, a polícia? Quem perde somos todos nós."
"Ficamos aqui correndo risco. O tráfico é o dia todo, brigas também. Há cerca de três semanas, um dos garotos que estavam brigando caiu em cima da banca, entornou um líquido que carregava nas mãos e ainda estragou nossos produtos. Queremos e precisamos trabalhar, mas assim não tem jeito," diz uma artesã que está no parque há oito anos e tem medo de se identificar.
Um taxista, 48 anos, também admite ter medo. "Se à noite é perigoso para nossa categoria em geral, de dia o problema é aqui no parque. Nunca sabemos se alguém está fugindo de uma briga, se está armado." Um comerciante que trabalha no parque relata que está fechando o negócio mais cedo. "Ficamos com medo durante o dia, mas, de noite, acho ainda pior. Estou fechando duas horas mais cedo que o normal, às 20h."
As pessoas ouvidas reclamam ainda da presença constante de moradores de rua. "Penduram roupas, fazem as necessidade fisiológicas no meio do parque e ainda pressionam os frequentadores para que deem esmola," diz uma mulher.
Parquinho
A suspeita de comércio de drogas afasta frequentadores do parquinho infantil, que, apesar de ter sido reformado nos últimos dias, parece não ser mais atrativo. Uma moradora da Cidade Alta foi com o filho de 2 anos ao local, mas observou de longe a movimentação na área onde quatro rapazes usavam as gangorras e o escorregador. Eles estavam na companhia de outros dois jovens. Quando abordada pela reportagem, ela disse estar perplexa. "Não tem como levar meu filho ali. Vi estes meninos entregando alguma coisa a duas pessoas, duas vezes. Parece droga. Vim ao Centro e ia aproveitar para proporcionar lazer ao meu filho, já que não tenho condições. Mas aqui não dá", desabafa.
Outra mulher que estava com a filha se diz assustada. "Não sabia que aqui estava assim. Como você traz seu filho para brincar e dá de cara com gente fumando maconha?" Uma aposentada, moradora do entorno, afirma que há muito tempo não leva os netos no espaço de lazer. "Antes vínhamos aqui pela manhã. Enquanto eu lia meu jornal, eles brincavam. Agora não tem mais hora segura para fazermos isto."
PJF aposta em monitoramento por câmeras
De acordo com o secretário de Governo, José Sóter de Figueirôa Neto, o comércio de drogas e a degradação do espaço já foram identificados e preocupam o Poder Público, que vem, aos poucos, realizando pequenas intervenções estruturais no Parque Halfeld. Ele acredita que a colocação de câmeras do programa "Olho vivo", previstas para o próximo mês, possam ajudar a melhorar os problemas ligados à segurança pública. "Uma câmera será instalada no parque, outras duas na esquina das ruas Marechal Deodoro e Santo Antônio. Elas vão inibir, por exemplo, o tráfico de drogas."
O secretário pontuou ainda que o projeto para melhoria da iluminação do parque e outras ações, que ele preferiu não detalhar, estão no plano de Governo do município. "O posto da Guarda Municipal no prédio da Funalfa também contribui para a sensação de segurança. Embora a segurança do local não seja de responsabilidade da Prefeitura, é uma preocupação nossa, e com estas ações tentamos ajudar na melhoria da mesma."
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