RODRIGO HERRERO
DE SÃO PAULO
O massagista que salva o gol da equipe rival em cima da linha no fim de um jogo não é a única história pitoresca que ronda a Série D do Campeonato Brasileiro.
Salários atrasados, prejuízo a cada jogo como mandante e até um lateral que vira pasteleiro nas horas vagas são outras histórias que estão no cotidiano da famigerada e esquecida quarta divisão.
Classificado às quartas de final e há dois jogos de obter o acesso à Série C, o Plácido de Castro-AC, equipe que fica a 100 km da capital Rio Branco, vive um situação comum a maioria dos 40 times que iniciaram a competição.
O time acreano, que se profissionalizou em 2008 após quase três décadas de amadorismo, está com os salários atrasados há cinco meses. A maioria dos atletas é formado na base e a folha salarial é de cerca de R$ 70 mil.
"A nossa dívida gira em torno dos R$ 200 mil. Por isso, criamos uma campanha na internet para pedir uma contribuição aos torcedores e empresários para quitar esse valor, mas não conseguimos. Agora, vamos pedir nas ruas e eventos da cidade", disse o diretor financeiro do clube José Roberto Faustino.
O jeito é se virar como pode. Como o lateral Irisvaldo, 35, conhecido como Íris. Para não depender do salário do futebol, ele faz e vende salgados. "Futebol do Acre é carente, jogo só por amor", disse.
"Acordo às cinco da manhã, faço o salgado e entrego na rodoviária. Na volta, preparo o café para a minha família e vou treinar. Depois volto para casa, faço o almoço e descanso antes do treino da tarde. Enquanto o corpo aguentar, eu continuo."
TIME DA PM
Outro clube que sonha em superar o calvário da quarta divisão nacional é o Tiradentes-CE. Fundado e gerido por policiais militares, o time só perdeu um jogo na primeira fase e possui a melhor defesa com quatro gols sofridos.
Cerca de 6 mil policiais sócios do clube bancam a equipe com contribuições mensais descontadas voluntariamente em folha de pagamento. Mas o time não tem torcida, o que dificulta a arrecadação para cobrir a folha salarial de R$ 100 mil.
O clube teve prejuízo de R$ 25 mil nos quatro jogos que mandou na primeira fase. A média de público não foi além de 120 pessoas.
Na Série D, a CBF banca apenas as passagens aéreas, hospedagem e alimentação nos jogos fora de casa. Mas há outras despesas.
"Jogamos no Presidente Vargas e as despesas são elevadas. É arbitragem, aluguel do estádio, ambulância, quadro móvel. É um campeonato muito deficitário", disse o presidente do Tiradentes e Subtenente da PM do Ceará José Arimatéia Fernandes.
"O que recebemos dos sócios cobre 60% dos gastos, o restante agimos de acordo com a demanda. Eu falo para um amigo comerciante que preciso ficar em um hotel, digo o valor e ele me ajuda. Assim a gente vai levando."
A competição, que rendeu prejuízo para maioria dos participantes, chegou a ter público de 28 pagantes no confronto entre Ypiranga-AP 0 x 0 Parnahyba-PI. A renda do jogo foi de R$ 195,00.
Rogério Morti/Divulgação/Agência Botafogo | ||
Partida entre J. Malucelli-PR x Botafogo-SP pela Série D teve como público 53 pagantes |
PREJUÍZO E VIAGENS LONGAS
Outra reclamação é quanto aos gastos relativos a quem é responsável por apitar as partidas.
"A taxa de arbitragem é muito alta. A CBF manda árbitros do Mato Grosso, de São Paulo, o que encarece o custo. Eles podiam regionalizar a arbitragem", reclamou o presidente do Gurupi-TO, Wilson Castilho. O time foi eliminado nas oitavas de final pelo Plácido de Castro.
Na primeira fase, o clube gastou R$ 26.176,56 apenas com remuneração, diárias de hotel e transporte para os árbitros, deixando um prejuízo de R$ 4.113,56 na sua arrecadação. "Disputar a Série D é uma penitência. O Gurupi não participou em 2011 e 2012 por causa dos custos."
Outro obstáculo para a equipe tocantinense foi a viagem nas oitavas de final. Para chegar até Rio Branco, na segunda-feira dia 2, e enfrentar o time acreano às 20h, a delegação saiu de ônibus de Gurupi às 13h de domingo em direção a Palmas.
Após três horas e quase 300 km, duas horas de espera para embarcar para Brasília. Depois de uma hora de voo, mais três horas na sala de embarque antes de ir a Rio Branco. A equipe chegou às 2h30 da manhã para jogar pouco mais de 17 horas depois.
"Os jogadores nem dormiram. E mal o jogo acabou, jantamos e voltamos para casa. Chegamos às 17h do dia seguinte", disse o presidente do clube Wilson Castilho.
NO TRIBUNAL
O caso do massagista Romildo Fonseca da Silva, o Esquerdinha, do Aparecidense-GO, que salvou o gol do Tupi-MG em cima da linha nas oitavas de final do torneio, será julgado pelo STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva) na próxima segunda.
O lance aconteceu no último sábado, quando as duas equipes empatavam por 2 a 2 --resultado que acabou classificando a equipe goiana. O massagista entrou em campo e salvou o chute do atacante Ademilson, impedindo o terceiro gol da equipe mineira.
O massagista se mostrou arrependido depois. "A emoção tomou conta naquele lance. Se a gente tomasse o gol, seria eliminado. Me arrependo porque foi um ato impensável. Peço desculpas aos jogadores, dirigentes e comissão técnica do Tupi", disse Esquerdinha, 42, que trabalha no clube goiano desde fevereiro.
Na terça-feira, o STJD suspendeu o resultado e deve marcar uma nova partida.
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