Mesmo vencendo cinco dos últimos seis carnavais, Marcus Valério Mendes vê dificuldade na realização da festa na cidade e fala do dia-a-dia da escola vencedora
Lucas Soares
Repórter
13/02/2015
Repórter
13/02/2015
A G.R.A.C.E.S. Unidos do Ladeira, com 39 anos de história, conquistou seu 13º título do Carnaval de Juiz de Fora, na última segunda-feira, 9 de fevereiro, após uma acirrada disputa com a Turunas do Riachuelo e a Real Grandeza, segunda e terceira colocadas, respectivamente, nos desfiles que aconteceram no sábado passado, 7.
Mas ter vencido o Carnaval por quatro anos consecutivos não significa que a vida na escola de samba é fácil. Em entrevista exclusiva, o presidente da Unidos do Ladeira,Marcus Valério Mendes, revelou os planos para o futuro, o planejamento da agremiação e as dificuldades para se fazer a festa em Juiz de Fora. Confira!
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Portal ACESSA.com - Qual foi a história da Unidos do Ladeira?
Marcus Valério Mendes - O Ladeira tem 39 anos completados agora em janeiro. Ela surgiu como bloco de Carnaval, depois passou a ser escola. Começamos no Grupo B, subimos ao Grupo A e somos uma das escolas mais jovens da cidade. Temos treze títulos do primeiro grupo, somos a mais vencedora da cidade. Em segundo lugar, vem a Turunas do Riachuelo com dez. Além disso, hoje alcançamos um fato que até então era inédito: o tetracampeonato conquistado nos igualou à Juventude Imperial.
Como você avaliou o desfile da Unidos do Ladeira? Ficou alguma coisa a desejar?
Em muitos quesitos ficou a desejar. Nós trabalhamos para tirar 10 em tudo, mas sabemos que tem quesitos que não tem como, como a Evolução. Nos outros a gente trabalhou. Sempre acontece uma coisa ou outra. Um destaque teve parte de sua fantasia quebrada, devido ao peso, e perdemos décimos na apuração de alegorias. Eu ainda não peguei a pasta dos jurados, mas vi alguns erros que serão trabalhados e consertados para o ano que vem. Nosso objetivo é tirar 10 em tudo, para mostrar à população de Juiz de Fora que o Unidos do Ladeira trabalha o ano inteiro, ininterruptamente, e com isso proporciona para a cidade um belo espetáculo.
Como é o dia a dia da escola durante o ano?
Nós trabalhamos o ano inteiro alugando o salão para eventos. Temos o baile do Fabrício & Gabriel às sextas-feiras e aos sábados e domingos eu tenho shows variados. Todo o dinheiro arrecadado nesses eventos é colocado na escola. Eu peguei a agremiação com quase R$ 300 mil de dívidas e paguei tudo. Hoje o Ladeira tem o nome limpo em todos os setores, não devendo nada a ninguém. Além disso, investimos na escola. Colocamos ar-condicionado, remodelamos o chão, as paredes. Estamos construindo um bar enorme no primeiro andar para lançarmos a Terça na Toca, que terá vários eventos diversos relacionados à samba. Nenhum diretor recebe nada daqui.
Quando começa a preparação para o próximo Carnaval?
Dei uns dias de folga para o pessoal, mas em março nós nos reunimos para decidir o enredo. Temos dois em evidência e vamos abrir para a diretoria e os amigos avaliarem. Através de sistema de votação eliminatória, nós vamos escolher o melhor enredo.
Como é a participação da comunidade do Ladeira na escola?
Nossa comunidade é muito pequena, é feita praticamente de três ruas. Mas ela é muito atuante, com vários diretores e conselheiros, que são dividido entre amigos, fundadores, ex-presidentes e pessoas da comunidade. Temos 31 conselheiros e cada representação tem um número de votos. A comunidade nos ajuda muito, além do apoio em tudo que a gente precisa.
Como é a preparação durante o ano? Isso gera quanto de emprego para a cidade?
Esse ano nós envolvemos cerca de 130 pessoas. A gente terceiriza. Temos um galpão de alegorias no Nova Era, um galpão de fantasias no Vitorino Braga, um galpão de costureiros no Bairu, um galpão de destaques na Avenida Sete e um galpão de bateria em São João del-Rei. Quando não são os diretores que fazem, são pessoas da própria comunidade que nos ajudam. Em abril nós vamos desmanchar as alegorias para preparar as do próximo ano. Enquanto isso, o nosso carnavalesco, Anderson Luiz, vai desenhar o esboço das fantasias para colocar no papel.
Quando a Unidos do Ladeira investiu neste Carnaval?
No ano passado, nós investimos R$ 274 mil. Esse ano as contas ainda não fecharam, mas eu fiz uma redução muito grande. A verba da Prefeitura de Juiz de Fora não aumenta há quatro anos, desde o último ano da administração do Custódio Mattos e mais três anos com o Bruno. Isso vem sufocando muito as escolas de samba, acreditamos que esse valor está em cerca de 40% defasado. Eles repassam R$ 622 mil: entre R$ 600 mil para as escolas, R$ 10 mil para a Corte Real e R$ 12 mil para premiações. Esses R$ 600 mil são divididos em 65% para o Grupo A e 35% para o Grupo B. Cada escola do Grupo A recebe R$ 64 mil. E nós das escolas, além da Liga das Escolas de Samba de Juiz de Fora, damos uma ajuda para a escola de Grupo C, já que a Prefeitura não dá nada. Pelas minhas contas, eu devo ter gastando entre R$ 170 mil a R$ 180 mil.
Existe apoio da iniciativa privada?
Não. Eles nunca nos apoiaram em nada. Inclusive o comércio vem reclamando que está tomando prejuízo no Carnaval, mas uns anos atrás, um outro presidente da Liga foi pedir para que cada comerciante desse, por exemplo, R$ 10 por ano para as escolas e foi rejeitado, pelo que eu fiquei sabendo. Então agora eles não têm porque reclamar da mudança dos dias do Carnaval.
Como você enxerga a parcela da população que acha que o Carnaval de Juiz de Fora é um dinheiro gasto à toa?
Só fala que é um dinheiro gasto à toa quem não gosta de samba e as igrejas evangélicas, o povo que não vem ver mesmo. Se eles viessem, não iriam ter esse pensamento. A mesma pessoa que fala que é um dinheiro gasto à toa senta pra ver o desfile do Rio de Janeiro na televisão e não tem coragem de vir aqui na avenida, ver o que nós fazemos. É um dinheiro gasto à toa? A Prefeitura gasta R$ 2 milhões no Carnaval, isso dá em média R$ 3 por habitante. É um investimento muito ínfimo perto do que é gasto em outras cidades. As pessoas que são contra, são contra tudo. Juiz de Fora é uma cidade sem alma. Tem um Carnaval maravilhoso e as pessoas não dão valor, tem o Miss Gay que acabou porque não deram valor. Tem um time de futebol que não tem público porque não dão valor, um time de vôlei que disputa a Superliga e quase ninguém sabe qual é. A população daqui não valoriza o que nós temos.
Você acha que as escolas daqui gastam muito com o Carnaval?
Não. É um investimento que você faz para o público. O dinheiro que a Prefeitura nos repassa não dá para pagar nem as pessoas que fazem as coisas para o Ladeira. Isso tudo gera uma gama de pessoas que estão trabalhando para a gente, seja o faxineiro, o empurrador de alegoria, quem confecciona fantasias... É um dinheiro gasto para pagar o pessoal que trabalha também, na compra de material.
Como a crise financeira que o país vive atingiu o Carnaval?
Nós entendemos que esse ano e ano passado poderia estar assim. Mas antes não estava. Eu acho que para uma cidade com quase 700 mil habitantes, investir R$ 2 milhões em cultura popular não é um grande investimento. Talvez em outras áreas eles estejam investindo acima do que pode ser investido. Eu não sei quanto que a Prefeitura gasta de propaganda, por exemplo, mas pelo que eu sei, o orçamento total é de R$ 1,4 bilhão pra esse ano. Eu não estou dentro da Prefeitura pra saber, mas é uma verba muito pequena para a cultura popular. Os blocos e as escolas de samba fazem a festa da população por dez dias. Isso dá mais ou menos R$ 0,30 por dia de investimento por pessoa. Quem não vai, não participa, eu não posso cobrar. Não participa e não vai porque não quer. As pessoas cortam um pouco a diversão. Quem vinha nos nossos shows e gastavam pouco, não vem mais. Quem gastava mais, está gastando menos e quem gastava menos, não estão gastando quase nada. O dinheiro arrecadado pra investir no Carnaval teve queda de 40%.
Qual expectativa sobre a antecipação do Carnaval em 2016? Se isso acontecer, o desfile vai acontecer em janeiro.
Ainda vai existir uma reunião com a liga, com a Polícia Militar (PM), a Prefeitura e a Settra. A antecipação pra nós, das escolas de samba, foi muito boa. O Carnaval em janeiro é ruim porque a cidade vai estar mais vazia por causa das férias e o nosso tempo vai ser menor para fazer os ensaios. Apesar da bateria começar a ensaiar em novembro, e os ensaios aberto ao público são a partir de janeiro. Vamos procurar uma solução. Talvez volte para a data oficial e eu dei a sugestão de adiar em uma semana.
Como os foliões podem fazer se quiserem desfilar pelo Unidos do Ladeira em 2016?
As fantasias são alugadas, porque se a gente for vender, fica fora da realidade da cidade. Nós confeccionamos, as pessoas nos procuram e alugam, de acordo com a ala que querem sair. Esse ano sobraram onze fantasias sem alugar, que foram doadas para a comunidade desfilar com a gente. São as pessoas mais simples que desfilam conosco. Falam que o Ladeira é uma escola de elite, mas não tem ninguém aqui que é assim. A maioria das pessoas que trabalha aqui são comuns. Criou-se esse dogma porque nós vamos luxuosos, com fantasias bonitas. Quem não quer luxo e riqueza?
Quais são os planos para o futuro?
Quando entrei aqui, há seis anos, a minha perspectiva era reestruturar o Ladeira como escola de samba. Consegui fazer isso, levei a escola à um patamar superior ao que estava antes. Eu fiz seis carnavais, ganhei cinco e ainda tenho mais um. Ano que vem vamos fazer um trabalho sério, melhor do que esse, e tentar o pentacampeonato, uma coisa inédita para o Unidos do Ladeira. Depois disso, nós vamos sentar, ver quem será o próximo presidente e tentar continuar nessa caminhada de sucesso. Farei tudo para ganhar o Carnaval de 2016 e, se alguém fizer melhor, me sentirei honrado porque fiz tudo aquilo que eu podia fazer e darei os parabéns.
http://www.acessa.com/cultura/arquivo/carnaval2015/2015/02/13-presidente-da-unidos-do-ladeira-fala-dos-desafios-do-carnaval-em-juiz-de-fora/
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