O Brasil não terá um sistema de artilharia antiaérea de média altura – com alcance de 15 km de altitude – na Copa do Mundo de 2014. O general José Carlos de Nardi, coordenador das Forças Armadas, afirmou ao G1 que esse tipo de equipamento não é uma exigência da Fifa, contrariando o que afirmou em 2012 o general Marcio Roland Heise, comandante do setor de artilharia à época.
"Esta informação da média altura não procede, não teve nada da Fifa neste ponto específico", disse José Carlos de Nardi. "É uma necessidade nossa que foi percebida antes mesmo da Copa, está sendo tratada como uma demanda emergencial do governo. Claro que ajudaria na defesa do espaço aéreo se chegasse [até o Mundial]".
Procurado pelo G1, o general Marcio Roland Heise disse que, na época em que coordenava as tratativas para a compra do equipamento, tinha a informação de que o sistema de média altura era uma recomendação da entidade organizadora. Na série de reportagens que o G1 fez sobre a o sucateamento do Exército, em agosto do ano passado, Heise havia dito que o objetivo era "adquirir tudo o que precisamos até a Copa" e que a Força estava "conduzindo um projeto para reformular material e também conceitos de uso, buscando também a capacidade de alvo a média altura".
Na época, outros generais do Comando de Operações Terrestres do Exército (Coter) também ressaltaram que a artilharia de média altura era pré-requisito para o Mundial. Em entrevista concedida em 2012, questionado sobre a necessidade do sistema como exigência da Fifa, o general Mário Lucio Alves de Araújo, do Estado-Maior do Exército, salientou que o governo estava empenhado em "suprir os vácuos e equipar as tropas para atender às necessidades exigidas nos grandes eventos esportivos".
O Ministério da Defesa informou que a exigência da Fifa não se refere especificamente ao termo média altura, mas que a organização pede um sistema de controle e segurança do espaço aéreo. Ainda segundo a Defesa, esse sistema inclui, entre outras coisas, o controle do tráfego e a defesa aérea.
Procurados pela reportagem, a Fifa e o Comitê Organizador Local da Copa do Mundo não dizem quais são as exigências em relação à defesa nem falam se há alguma exigência em relação ao sistema aéreo. Ambos disseram que o tema é tratado pelo governo federal e que a questão é individualizada com cada país hospedeiro do evento.
Possibilidade para a Olimpíada de 2016
Em fevereiro, quando a presidente Dilma Rousseff encontrou o premiê Dmitri Medvedev em Brasília, foi dado início à negociação da compra de três baterias russas Pantsir-S1, de médio alcance, avaliadas em cerca de US$ 1 bilhão (R$ 2,29 bilhões). O acordo, no entanto, ainda não foi fechado. Atualmente, o país possui apenas canhões e mísseis para baixa altura, com alcance de até 3 km.
De acordo com o general José Carlos de Nardi, "há uma possibilidade" de que alguns carros do modelo Pantsir cheguem ao Brasil até a Olimpíada. Em fevereiro de 2014, militares vão à Rússia verificar na prática o modelo, segundo o militar. Para se ter uma ideia da importância do sistema de média altura, todos os países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) contam com essa tecnologia.
O processo de compra dos equipamentos russos envolve três fases: na primeira, chamada de "exploratória", que é a atual, os militares desenvolvem requisitos técnicos conjuntos para Marinha, Aeronáutica e Exército para a compra e o uso do sistema. Depois disso, haverá a fase de negociação e, por fim, o fechamento do contrato.
"Estas negociações envolvem muitos interesses e setores. É importante ir com calma e tranquilidade", afirma o general Guido Amin Naves, comandante da Artilharia Antiaérea do Exército. Ele disse desconhecer o andamento das tratativas com a Rússia e também a exigência da Fifa porque o assunto é tratado pela Defesa. Procurado para comentar o atraso na chegada da artilharia, o general Marcio Roland Heise também disse que o processo agora está com o Ministério da Defesa.
Em setembro de 2013, uma portaria publicada no Diário Oficial da União pelo ministro da Defesa, Celso Amorim, determinou que a aquisição dos equipamentos russos de médio alcance passasse a ser responsabilidade da Aeronáutica.
'País à mercê de ataques terroristas'
O general da reserva Nelson Santini Júnior, que comandou a brigada antiaérea e iniciou os trabalhos para renovação do equipamento para os grandes eventos esportivos que o Brasil vai receber em 2014 e 2016, afirmou ao G1 que o país ficará à mercê de ataques terroristas sem o Pantsir. Segundo ele, o sistema de média altura é exigência de países que participam da competição da Copa.
"Média altura é uma exigência de alguns países mais preocupados, como Estados Unidos, Israel, Inglaterra, que normalmente pedem recursos compatíveis com o risco", disse Santini. "Este atraso compromete a segurança dos estádios. Vamos ficar com uma defesa aérea bastante vulnerável, com pouca capacidade de reação. Sem média altura, não existe defesa aérea", completou.
Por e-mail, o Ministério da Defesa disse não ter informação, até o momento, sobre pedidos feitos por países que vão disputar o Mundial em relação à defesa aérea.
"Se um monomotor se aproximar do Maracanã durante um jogo com 10 quilos de explosivos a bordo, que são capazes de derrubar uma casa, você não terá como abatê-lo com o caça a média altura. Com um míssil, a baixa altura, causará um grande estrago, com muitas mortes. É como defender sua casa de um ladrão armado com pistola com seguranças usando apenas cassetete", comparou o general Santini.
O general Guido Amin Naves garante a proteção dos estádios. [O sistema de média altura] É uma capacidade que não temos e que estamos negociando há muito tempo. Tendo-a, seria muito bom, mas se não chegar a tempo, coordenamos com a Força Aérea os sistemas de radares e acionamento de aviões e caças para dar um jeito para isso. O importante é que o evento transcorra da melhor maneira possível."
Parceria com a Rússia
Segundo o general De Nardi, a proposta da Rússia para o Ministério da Defesa envolve uma "parceria". Informalmente, a Rússia corre por fora no projeto FX-2, que pretende adquirir um novo caça para o Brasil. Os russos ofereceram à FAB o modelo Sukhoi. O melhor avião de combate do país, o Mirage, será aposentado dia 31 de dezembro. Até agora não há decisão sobre o seu sucessor.
Além das três baterias Pantsir-S1, o governo quer comprar também duas baterias do modelo Igla, com mísseis portáteis, que podem ser lançadas por apenas um homem, sistema que o Exército já possui. Em fevereiro, oito oficiais brasileiros, especialistas na área, irão à Rússia "para verificar na prática" o funcionamento do Pantsir, segundo o Ministério da Defesa.
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