27 de Janeiro de 2013 - 07:00
Mato alto, brinquedos quebrados e iluminação deficitária impedem a frequência às áreas de lazer
Por DANIELA ARBEX
Quadras tomadas pelo mato alto, brinquedos quebrados e falta de iluminação. A realidade de abandono das praças de Juiz de Fora tem afastado a população dos espaços públicos e transformado locais esquecidos em alvos de vandalismo e até mesmo cenários da violência que tem vitimado um número crescente de adolescentes e adultos na cidade. O descaso com as áreas coletivas e de socialização são um alerta de que o principal patrimônio das cidades, o ser humano, não vem sendo respeitado.
Um exemplo de degradação de área de lazer é a praça do Jardim do Sol, localizado na Zona Sudeste, região que ocupa o segundo lugar no ranking de crimes violentos cometidos em 2012. No local, as luminárias estão quebradas ou submersas em água, os gradis encontram-se estragados, a quadra tem ferragem aparente, o travessão está sem redes e a base para basquete sem cesta. No parque infantil, além da sujeira, chama a atenção o fato de apenas um balanço ter resistido à falta de manutenção. O mato alto invade a quadra e parte da área que deveria estar sendo utilizada por crianças.
O estudante Felipe de Souza, 16 anos, lamenta as condições do único espaço aberto do bairro. "Tentamos usar a quadra, mas corremos risco de nos machucar, pois a ferragem está aparecendo. Antes a escola municipal do bairro utilizava esta quadra. Hoje não há condições para isso."
A esteticista Gisele Costa, 44, mãe de um adolescente, 13, também se ressente da falta de atenção do Poder Público. "A Prefeitura precisa oferecer opções de lazer para a população. Hoje a nossa praça está sendo usada para venda de droga. O problema é também dos moradores, que não cuidam desse lugar."
No Parque Burnier, na mesma região, a situação é ainda mais grave. A vegetação cresceu no terreno usado como campo de futebol, tornando difícil sua utilização e provocando seu abandono. Juliana Rezende, 22, mãe de um bebê de 8 meses e de um menino de 5 anos, afirma que proibiu o filho mais velho de usar o local. "Hoje ele brinca na rua e, por mais de uma vez, quase foi atropelado. Algumas vezes, o próprio pessoal do bairro faz a limpeza. É um absurdo que tenha chegado neste ponto."
Ainda na Zona Sudeste, a praça do Vitorino Braga é outra que carece de mais atenção. Embora os equipamentos públicos estejam menos degradados do que nas duas áreas anteriores, o mato invadiu um dos campos de futebol, causando contraste com o outro campo e com a pista de skate existentes no mesmo endereço. O presidente da ONG Unibairros, Paulo Cezar de Oliveira, conta que tem tentado manter a praça em movimento, com atividades promovidas pela entidade que dirige, cuja porta principal fica de frente para a área. Além de aulas de capoeira e música, oferecidas a 70 crianças da região, a ONG disponibiliza reforço escolar, ações culturais e esportivas.
"Também realizamos trabalho com os grafiteiros, a fim de impedir a pichação da praça. Chegamos a promover mutirões de limpeza. Não quero empurrar toda a responsabilidade da situação para uma Administração que está chegando agora, mas o fato é que a Prefeitura precisa fazer a parte dela, porque a comunidade está cada vez mais distante da praça. Os moradores querem um lugar salubre e seguro para frequentar." Outra questão que estaria contribuindo para esse afastamento é o tráfico de drogas, com utilização de crianças e adolescentes.
O professor da Faculdade de Comunicação da UFJF e do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), Wedencley Alves é enfático ao dizer que o exemplo de cuidado com o patrimônio deve partir do Poder Público, maior responsável pela manutenção dos espaços de lazer.
Levantamento
O secretário de Governo, José Sóter Figueirôa, informou que está sendo feito um levantamento da situação das praças e adotadas iniciativas preliminares com o trabalho de poda de árvore e corte de grama. "O plano de Governo de Bruno Siqueira tem três grande prioridades: saúde, mobilidade urbana e o combate à violência. Evidentemente que a praça tem um papel estratégico e importante para as comunidades. No entanto, nós encontramos o setor de parques e jardins da Empav totalmente desestruturado. Nosso primeiro trabalho está sendo o de organização do setor."
Figuerôa afirma está sendo feito um estudo para que a gestão das praças seja da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e a execução pela Empav. No próximo ano, a Prefeitura ainda pretende implantar a Praça de Esporte e Cultura, cujo trabalho envolve um conjunto de ações articuladas e integradas com a educação, assistência social e esporte e cultura. "Temos muito trabalho a fazer."
Realidades diferentes na Cidade Alta
Na Cidade Alta, situações diferentes podem ser observadas. Na praça de São Pedro, bairro onde três jovens foram baleados nos últimos meses, além da falta de capina, há problemas com a iluminação e com as grades da quadra, que estão danificadas. O lixo também vem sendo descartado irregularmente no local. Morador da área há mais de 40 anos, o cozinheiro Alexandre Lanzimar, critica a falta de manutenção e diz que a frequência de público tem diminuído. "Além de não termos acesso a lazer, a violência tem afastado as pessoas daqui. À noite, ninguém mais fica na praça."
Na mesma região, a praça do Caiçaras é o oposto da localizada no bairro vizinho. Construída há um ano, ela é um bom exemplo de que um espaço bem cuidado pode aproximar as pessoas. No dia 16 de janeiro, às 17h30, mais de 30 pessoas da comunidade realizavam atividades diferentes na área. Além do futebol, envolvendo cerca de dez adolescentes disputando a partida e outro grupo acompanhando o jogo na arquibancada, a pista de skate era utilizada por crianças, e as mesas de jogos por meninas de idades variadas.
Ponto de encontro
Apesar da reclamação de alguns moradores em relação à iluminação e à sujeira provocada por animais, o local tornou-se ponto de encontro e de lazer. Coincidentemente, nenhuma vítima de crime violento ocorrido na cidade nos últimos 12 meses é do Caiçaras. Rafael da Silva, 19 anos, era um dos rapazes que participavam do jogo de futebol. Auxiliar de cozinha, ele tinha acabado de retornar para casa após mais um dia de trabalho. "É bom chegar e ter alguma opção de lazer, poder jogar bola e usar a praça", comentou.
O professor Wedencley Alves avalia que Juiz de Fora, como outras cidades brasileiras, não é pensada como espaço social. "Tradicionalmente, (a cidade) é pensada apenas para alguns, o que certamente resultará em problemas para todos.
Nas áreas em que a população tem maior poder aquisitivo há mais cuidado com os espaços públicos do que nas pobres. E, quanto maior é o abandono de um local, menor é a condição de se cobrar cuidados em relação à ele. Na cidade de alguns, uma parcela da população acaba sendo varrida para debaixo do tapete, sem acesso não só a serviços básicos de saúde e educação, mas de lazer e cultura. Quando o indivíduo percebe que não está sendo beneficiado em nada, que o Poder Público lhe deu as costas, é evidente que passa a não se identificar com a cidade", explica.
Na opinião do especialista, que desenvolve projetos de pesquisa sobre juventude e violência, o resultado disso é a perda da autoestima de uma comunidade e uma profunda falta de reconhecimento do local onde se vive. "Se um lugar é mal cuidado, abandonado pelas autoridades e pela sociedade, deixa de ser cuidado pela comunidade. Quando grupos sociais se vêem diante da falta de motivação e de estima, podem ter reações menos comprometidas com a integridade do patrimônio", destaca.
Wedencley reforça que modelos de exclusão tendem a impactar os modos de expressão da juventude.
Conforme o especialista, no momento em que a juventude se expressa pela violência é sinal de que estão faltando outros modos possíveis de expressão. "Numa cidade vista como lugar de silenciamento, formas marginais de expressão podem surgir. A abertura para o diálogo se dá também pela forma como ela (a cidade) é administrada. Ao se priorizar grades e cercas, há uma recusa ao contato humano e à integração social."
Especialista critica 'modelos de exclusão'
Wedencley Alves é enfático ao dizer que o exemplo de cuidado com o patrimônio deve partir do Poder Público, maior responsável pela manutenção dos espaços de lazer. Segundo ele, Juiz de Fora, como outras cidades brasileiras, não é pensada como espaço social. "Tradicionalmente, é pensada apenas para alguns, o que resultará em problemas para todos. Nas áreas em que a população tem maior poder aquisitivo há mais cuidado com os espaços públicos do que nas pobres. E, quanto maior é o abandono de um local, menor é a condição de se cobrar cuidados em relação à ele. Na cidade de alguns, uma parcela da população acaba sendo varrida para debaixo do tapete, sem acesso não só a serviços básicos de saúde e educação, mas de lazer e cultura. Quando o indivíduo percebe que não está sendo beneficiado em nada, que o Poder Público lhe deu as costas, é evidente que passa a não se identificar com a cidade", explica.
Na opinião do especialista, que desenvolve projetos de pesquisa sobre juventude e violência, o resultado disso é a perda da autoestima de uma comunidade e uma profunda falta de reconhecimento do local onde se vive. "Se um lugar é mal cuidado, abandonado pelas autoridades e pela sociedade, deixa de ser cuidado pela comunidade. Quando grupos sociais se vêem diante da falta de motivação e de estima, podem ter reações menos comprometidas com a integridade do patrimônio", destaca. Wedencley reforça que modelos de exclusão tendem a impactar os modos de expressão da juventude.
Segundo José Sóter Figuerôa, está sendo feito um estudo para que a gestão das praças seja feita pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente e a execução pela Empav. No próximo ano, a Prefeitura ainda pretende implantar a Praça de Esporte e Cultura, cujo trabalho envolve um conjunto de ações articuladas e integradas com a educação, assistência social e esporte e cultura. "Temos muito trabalho a fazer."
http://www.tribunademinas.com.br/cidade/degradac-o-de-pracas-afasta-comunidade-1.1221753
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