Carro e moto na garagem, vaca no pasto, grãos maduros nos pés de café nas lavouras, emprego como vereador, renda superior a meio salário mínimo por pessoa em casa. Se um brasileiro chegasse para fazer o cadastro no Programa Bolsa Família com qualquer um dos itens acima, na prefeitura da cidade em que mora, nem começaria a se inscrever, teoricamente. Mas em pelo menos sete municípios do interior de Minas isso foi possível.
É o que aponta um relatório da Controladoria Geral da União (CGU), que encontrou possíveis irregularidades na condução do programa, em que algumas pessoas com essas características estavam recebendo os benefícios.
Nos relatórios da CGU divulgados recentemente foram auditadas as cidades de Itacarambi, Caetanópolis, Guimarânia, Córrego Danta, São Roque de Minas, Rio do Prado e Coronel Murta. Nessas cidades, aproximadamente 6.400 famílias recebem o benefício do programa, e a CGU encontrou indícios de irregularidades em menos de cem.
O Hoje em Dia entrou em contato com todas as prefeituras, mas apenas quatro responderam.
O chefe de gabinete da Prefeitura de São Roque de Minas, Wilson Soares Pereira, disse que cerca de 30 famílias, das aproximadamente 380 que recebem o Bolsa Família no município, já foram excluídas do programa, e que será feito um recadastramento. Segundo Wilson, nenhuma delas tinha vínculo empregatício com a prefeitura.
Ele explicou que muitas famílias têm migrado de faixa de renda e que poderiam ter devolvido o cartão. São diaristas e lavradores, por exemplo, que fazem o cadastro, melhoram de vida e continuam a receber o benefício, apesar de não mais cumprirem as exigências do programa.
Isso ocorre, segundo Wilson, porque apenas dois funcionários trabalham no setor na prefeitura, e não é possível realizar recadastramentos frequentes. O recadastramento das famílias é feito a cada dois anos, por amostragem. Segundo Wilson, com essa metodologia, várias famílias já foram excluídas do programa, antes mesmo do relatório da CGU.
Informalidade
O assessor jurídico da prefeitura de Córrego Danta, Mateus Botinha, disse que a atual administração cancelou alguns cartões que estavam irregulares. Entretanto, reconheceu que um dos grandes problemas encontrados é que as famílias são as responsáveis pelas informações da renda.
“Na maioria das vezes, como não há como comprová-la documentalmente dada a informalidade das atividades que eventualmente geram renda, estas famílias omitem informações importantes para assim obterem o benefício”, reconhece.
A procuradora de Guimarânia, Lorena Resende, afirmou que o relatório da CGU foi feito com base na administração anterior, e que os problemas serão sanados. Já a prefeitura de Caetanópolis informou que encaminhou a demanda para a secretaria Municipal de Assistência Social e ao Setor de Benefícios de Prestação Continuada, para análise e posterior posicionamento.
Falta índice
Nem a CGU nem o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) têm um número das fraudes ao Bolsa Família no Brasil ou em Minas. Entretanto, o MDS informou que realiza cruzamento de dados periodicamente para evitar que situações ocorram. De acordo com o MDS, quando há suspeitas de fraudes, os benefícios são primeiramente analisados e podem ser bloqueados ao longo da apuração.
Condições para ser beneficiário
A legislação que trata do Programa Bolsa Família determina que a concessão dos benefícios dependerá do cumprimento de condicionalidades relativas ao exame pré-natal, ao acompanhamento nutricional, ao acompanhamento de saúde, à frequência escolar de 85% em estabelecimento de ensino regular. Além disso, um dos principais requisitos para que a família seja beneficiária é não ter renda per capita superior a meio salário mínimo (R$ 362,00). O valor médio do benefício das famílias em situação de extrema pobreza é de R$ 242. O valor pago por família varia de acordo com a severidade da pobreza.
Vereador mantinha vínculo com programa
Em Itacarambi, no Norte de Minas, há aproximadamente 2.300 beneficiários do Programa Bolsa Família. Mas um deles chamou a atenção dos auditores da Controladoria Geral da União (CGU).
Uma das famílias que estava recebendo o benefício não morava mais na cidade. No cruzamento de dados da Relação Anual de Informações Sociais (Rais), foi verificado que o cônjuge da responsável familiar havia sido eleito vereador na cidade vizinha de Miravânia, distante 70 quilômetros.
Outro caso curioso na cidade, descoberto também com o cruzamento de dados da Rais, foi de uma família que havia se mudado para Marabá, no Pará, há 1.678 quilômetros de distância, mas que ainda continuava com o cadastro ativo.
Somente após a visita da assistente social foi constatado que a família não morava mais no município.
Carros e vacas
Já em São Roque de Minas, no Alto Paranaíba, alguns beneficiários foram flagrados pela fiscalização da CGU com automóveis na garagem e renda per capta superior à máxima estabelecida pelas normas do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS).
Havia até mesmo um proprietário rural com várias cabeças de gado, produção de leite e lavoura de café.
http://www.hojeemdia.com.br/noticias/suspeita-de-fraude-no-bolsa-familia-em-sete-cidades-mineiras-1.280949
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