Às vésperas de completar um ano, o caso que ajudou a lançar luzes sobre um dos maiores mistérios da ditadura militar no Brasil chega à reta final na Justiça estadual. Acusados do assassinato do coronel de reserva do Exército Julio Miguel Molinas Dias, dois PMs deverão receber a sentença nos próximos dias.
Se na esfera judicial o crime está próximo da solução, no plano político-histórico um capítulo sombrio dos Anos de Chumbo permanece nebuloso. Até agora, pouco avançou a apuração do desaparecimento e da morte do deputado Rubens Paiva, nos anos 70, por comissões da Verdade, após o surgimento de documentos guardados por Molinas.
Envolvidos no assassinato do coronel de reserva do Exército Julio Miguel Molinas Dias, 78 anos, um assalto frustrado, em 1º de novembro de 2012, os soldados da Brigada Militar Denys Pereira da Silva, 24 anos, e Maiquel de Almeida Guilherme, 32 anos, serão julgados nos próximos dias.
Presos preventivamente desde dezembro por suspeita de latrocínio (roubo com morte), os dois PMs respondem a processo que tramita na 5ª Vara Criminal do Fórum Central de Porto Alegre. As coletas de depoimentos e de provas já se encerraram, e a defesa e o Ministério Público apresentaram memoriais (alegações finais), faltando apenas a sentença do juiz Luís Felipe Paim Fernandes.
A morte de um oficial do Exército, executado a tiros na porta de casa por policiais, já seria suficiente para chamar atenção. Mas o caso ganhou relevância nacional quando a Polícia Civil, procurando pistas, colocou as mãos no arquivo pessoal de Molinas. Ex-chefe do Destacamento de Operações de Informações - Centro de Operações de Defesa Interna (DOI-Codi), no Rio, o oficial guardava em casa um tesouro histórico.
Uma pasta com 200 folhas, a maioria com timbre do Ministério do Exército, continha o registro de entrada do ex-deputado federal, engenheiro civil e empresário paulista Rubens Paiva, no DOI-Codi. A passagem de Paiva pelo temido centro de tortura, em 1971, jamais foi admitida pelas Forças Armadas. Também fazia parte do acervo uma espécie de diário, contando, em detalhes, manobras dos militares para encobrir o atentado a bomba no Riocentro, protagonizado por homens do serviço de espionagem do Exército, em 1981.
A descoberta dos documentos ajudou a esclarecer circunstâncias dos dois casos, mas em nada contribuiu para elucidar a morte de Molinas. O envolvimento dos PMs, lotados no 11º Batalhão de Polícia Militar, começou a ser descoberto a partir de suspeitas de que eles integrariam um grupo de assaltantes que agia nas redondezas do posto da BM onde trabalhavam, na Zona Norte.
Conforme o delegado Luís Fernando Martins de Oliveira, os PMs conheceriam Molinas — ele morava havia 30 anos no bairro Chácara das Pedras, distante 900 metros do posto da Brigada. Os soldados saberiam que o coronel colecionava armas, mas não teriam noção de quais. Molinas tinha 23, entre revólveres, pistolas e espingardas. Para o delegado, o interesse dos soldados seria obter armamento para praticar assaltos.
— Acredito que eles (PMs) imaginavam que a vítima tinha fuzil, mas eram só armas antigas, com valor simbólico como relíquias, mas sem grande poder de fogo — diz Oliveira.
Os dois PMs e outro soldado (também preso) são acusados de assalto a uma farmácia duas semanas antes do assassinato. Os policiais estariam encapuzados, mas roupas semelhantes a usadas por dois bandidos foram apreendidas na casa dos PMs. Um celular, roubado na farmácia, foi recolhido na moradia de um deles. O processo tramita na 5ª Vara Criminal.
Na Corregedoria da BM, foram instaurados procedimentos administrativos que apuram a conduta dos PMs no assalto. O prazo de conclusão seria 20 de outubro, mas foi prorrogado. Os dois soldados estão sujeitos a penas que vão de 20 a 30 anos de reclusão pelo latrocínio e de quatro a 10 anos pelo assalto, e também podem ser expulsos da tropa.
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