01 de Outubro de 2013 - 07:00
Usuários reclamam de longa espera e de quadro de horários descumprido, enquanto coletivos da mesma linha ficam parados simultaneamente no final dos itinerários
Por Nathália Carvalho
Usuários de ônibus urbanos de Juiz de Fora convivem com longos momentos de espera nos pontos, tanto na região central quanto nos bairros. Enquanto isso, em muitos pontos finais, dois, três e até quatro veículos da mesma linha são flagrados estacionados simultaneamente. A situação, conforme denúncias de moradores, reflete uma realidade do transporte coletivo já desgastada que prejudica a população. Enquanto passageiros questionam a situação, a Prefeitura garante que é realizada a atualização constante do quadro de horários.
Na última terça-feira, a Prefeitura anunciou que o trânsito de Juiz de Fora irá ganhar 7,2 quilômetros de faixas exclusivas para ônibus a partir deste mês. A medida integra o projeto "JF+mobilidade", um conjunto de ações que visa a otimizar o sistema de transporte coletivo no município. Além disso, no mesmo dia, foi assinado o contrato para que sejam iniciados os estudos técnicos que objetivam reavaliar o sistema de transporte coletivo da cidade, cujo edital foi liberado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) no dia 7 de agosto. Usuários, porém, afirmam que o primeiro passo para melhorar o transporte é o cumprimento de horários dos coletivos, já que o quadro atual leva alguns carros a circularem lotados, porque, com o maior tempo de espera nos pontos, há um acúmulo de passageiros e, consequentemente, maior desconforto e atraso nas viagens. Usuários reclamam ainda dos abrigos sem estrutura e das recorrentes situações de violência, como assaltos e o recente caso de um ônibus da Viação São Francisco, incendiado no Bairro Santa Cruz.
A Tribuna percorreu pontos finais de linhas de ônibus ao longo da cidade, onde ouviu reclamações dos usuários. No Bairro Santos Dumont, Cidade Alta, a auxiliar de escritório Josiani Vilela conta que os coletivos das linhas 534 e 539 estão constantemente parados juntos no ponto final, na Rua Pedro Germano Caniato. "Geralmente, a situação acontece entre 18h30 e 19h30, mas já vimos em outros horários do dia também. O bairro tem cinco ônibus e, às vezes, ficam quatro parados ao mesmo tempo. Quem está no Centro fica sem poder ir para a casa", diz. A situação já havia sido denunciada em matéria da Tribuna há três meses, mas, segundo a moradora, o problema persiste.
Na mesma região, Marcello Alves, morador de São Pedro, reclama dos atrasos constantes nas linhas 536 e 540. "Os horários nunca coincidem, e os ônibus estão passando no meu ponto do Centro com uma hora de atraso. Um dia desses saí do trabalho às 18h e só consegui pegar o ônibus às 20h. Foram mais de duas horas para chegar em casa. É lamentável Juiz de Fora ter um transporte deficiente desta forma", reclama.
No último dia 16, em menos de 30 minutos, ônibus das linhas 221 e 222, que fazem quase o mesmo itinerário Bom Pastor/Santa Catarina, permaneceram parados ao mesmo tempo no ponto final, na Rua Visconde de Mauá. A equipe chegou ao local às 15h44, quando havia dois coletivos, sendo um de cada linha, estacionados. Seis minutos depois, o 222 deixou o local e, após três minutos, chegou outro 221. Os dois coletivos desta linha permaneceram parados juntos por cerca de sete minutos. Questionada, a Settra alegou que a situação acontece pela coincidência de horário entre as linhas, mas que a fiscalização é recorrente no trecho.
Já na Região Nordeste, no Democrata, moradores questionam o porquê dos dois ônibus da linha 621 estarem constantemente parados simultaneamente no ponto final. "Se nos basearmos nos horários disponibilizados na planilha, perdemos um ônibus", comentou um morador, que preferiu não se identificar. No Milho Branco, Zona Norte, o produtor Cezar Campos comenta que, com frequência, os carros da linha 646 passam ao mesmo tempo nos pontos. "Enquanto os primeiros iam lotados, os outros passavam vazios." Ainda na mesma região, desta vez no Bairro Industrial, moradores se indignam por ficarem horas esperando o 604 no Centro, enquanto até três ônibus são vistos parados no ponto final.
Segundo o professor Marcelo Borges, no Cruzeiro do Sul, Zona Sul, os ônibus das linhas 213, 214, 215 e 299 andam em comboio e, quem perde o último, precisa aguardar horas esperando que o primeiro retorne. No dia 17, por volta das 19h30, a situação foi percebida. "Acabei de ver seis ônibus passando, um em seguida do outro, em um intervalo de dez minutos. O percurso é de cerca de 30 minutos, tempo de espera das pessoas que estão no Bairu."
Vídeo denuncia problema
Os atrasos frequentes em ônibus levaram um usuário indignado a filmar a situação da linha 501, que liga os bairros Jardim Glória e Paineiras. A situação gravada na tarde do dia 11 de setembro ganhou repercussão nas redes sociais. O vídeo mostra quatro veículos parados na praça do Jardim Glória, trânsito tumultuado e passageiros esperando para embarcar. Segundo o morador Fred Drumond, que realizou o registro, o problema é reincidente entre 16h e 19h. "É comum vermos os ônibus da linha andando em comboio. Contudo, no dia seguinte da gravação, apesar de terem passado em um horário muito próximo, eles não ficaram estacionados como sempre fazem. Acho que surtiu efeito." O estudante Igor Rhein, 20, confirma a situação. "Depois que colocaram o vídeo na internet, melhorou um pouco."
No ponto de ônibus, as opiniões são as mesmas. "Esse é um fato recorrente aqui na rua, todo mundo sempre soube. Além de tudo, essa situação causa problema no trânsito do entorno", comenta um comerciante de 44 anos. As irmãs Marli, 73, e Vera Lúcia Barzocchini, 56, vivem o mesmo dilema. "Essa linha nunca teve horário fixo, não tem hora certa para chegar e nem para sair. Muitas vezes, prefiro andar a pé", comenta Vera. "Eu tenho problemas de locomoção, não consigo ir para o Centro sozinha. Estamos muito mal servidas de ônibus", completa a irmã. A aposentada Marisa Barros, 63, garante já ter esperado pelo coletivo por mais de uma hora. "Vejo o horário no site e venho para o ponto, mas acontece muito de o motorista adiantar ou atrasar a saída, e aí complica nossa vida."
A Settra admitiu o problema, mas disse se tratar de uma situação isolada. "Pedimos as imagens dos veículos e, caso tenha ocorrido irregularidades, haverá autuação. Esta é uma linha que ainda não conseguimos encontrar uma maneira ideal de funcionamento e, portanto, ônibus acabam sendo vistos ao mesmo tempo no ponto final", explica o fiscal do Departamento de Fiscalização e Vistoria de Transporte Público, Luiz Gonzaga Paiva. Sobre as reclamações, Paiva garante que os usuários não fazem a denúncia da devida forma, com identificação dos profissionais, dia, hora, prefixo do carro e da linha. "Só assim podemos analisar as imagens com precisão, para tomarmos as devidas providências."
Por meio de sua assessoria, a Astransp informou que não pode se posicionar a respeito, pois casos como estes são considerados pontuais, já que não impactam a cidade inteira. A assessoria informa ainda que, quando há uma reclamação, o problema é tratado diretamente com a empresa responsável pela linha.
Revisão de horários é urgente
Com relação aos problemas identificados de ônibus parados nos pontos finais, a Settra respondeu à demanda, analisando os casos denunciados pela reportagem. Segundo o fiscal do Departamento de Fiscalização e Vistoria de Transporte Público, Luiz Gonzaga Paiva, normalmente, motoristas ficam parados em média cinco minutos nos pontos finais. "Se em uma viagem, ele teve um trânsito melhor, sobra mais tempo para a próxima saída, mas, se tiver atrasado, ele precisa chegar e sair imediatamente. Temos linhas cujos veículos ficam 20 minutos nos pontos, pois não temos demanda para rodar o dia todo." Ainda segundo ele, o quadro de horários contempla imprevistos no trânsito, mas não há como precisar o tempo certo que será gasto.
Na avaliação do presidente do Sindicato dos Trabalhadores em Transporte Rodoviário (Sinttro), Adilson Rezende, o ponto crucial deste problema está relacionado com o quadro de horários arcaico adotado pela Settra aliado ao grave problema do trânsito. "Temos consciência de que existem horários muito próximos, e o próprio trânsito não oferece condição de concluir o itinerário dentro do tempo estipulado." Segundo ele, mensalmente, há um levantamento dos problemas, que é encaminhado à Settra. "O problema é que, enquanto entregamos um relatório sobre 30 linhas, vemos que eles modificam apenas uma. Os horários não condizem mais com a realidade e precisam ser mudados urgentemente."
Sobre o levantamento do sindicato, a chefe do Departamento de Transporte Público da Settra, Andrea Gonzales Santos, explica que a pesquisa não é técnica, visto que é feito por meio de entrevistas. "Para realizar este tipo de trabalho, são necessários pessoal e material. Para fazer este tipo de levantamento, acompanhamos o tempo de viagem da linha durante oito horas, observando as chegadas e as saídas."
Segundo Andrea, em 2009, foi realizada uma ampla pesquisa, que culminou em total remanejamento do quadro de horários. "Desde então, estamos sempre realizando alterações, de forma sistemática. Quando a comunidade reclama de determinado horário, fazemos a proposta de um novo quadro, apresentado ao representante de bairro e que, muitas vezes, não é aceito pela comunidade. Isso representa uma dificuldade para realizar as mudanças."
Fiscalização
Para o especialista em transportes Cézar Henrique Barra, o transporte público não alimenta mais a situação atual da cidade e nem favorece com que as pessoas optem por deixar os carros em casa. "É necessária uma fiscalização mais rigorosa e a execução imediata de modificações estruturais em todo o sistema de transporte coletivo. As administrações públicas organizam projetos, mas trocam-se prefeitos, e a cidade não muda há décadas", reflete.
O fiscal da Settra Luiz Gonzaga informa que a fiscalização é feita em pontos finais, no interior dos veículos e ao longo do itinerário, normalmente das 6h às 21h. "Temos o apoio das câmeras internas, dos discos de tacógrafo que medem a velocidade e do tempo percorrido, entre outros. Após a análise desse processo, as irregularidades são punidas com autuações enviadas às empresas." De janeiro à primeira quinzena de setembro, foram emitidas 52 multas ou autuações, por motivos como descumprimento de horário, mudança de itinerário, motorista sem identificação, entre outros.
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