O posicionamento firme da Procuradoria-Geral da República (PGR) que move ação direta de inconstitucionalidade (Adin) no Supremo Tribunal Federal (STF) pedindo a suspensão da lei que efetivou aproximadamente 98 mil servidores não concursados da rede de educação de Minas Gerais provocou um sentimento de apreensão nos corredores das escolas de Juiz de Fora. A peça jurídica ameaça os empregos de profissionais de 14 cargos do sistema de ensino, como professores, assistentes educacionais e auxiliares. O processo já recebeu determinação de rito abreviado dada pelo ministro Dias Toffoli, relator da matéria, o que significa que será julgado diretamente no mérito pela Corte. A iminência de uma decisão desfavorável traz insegurança para os profissionais efetivados.
"Estão todos visivelmente apreensivos com essa situação. A ação nos pegou de surpresa", afirma o professor e diretor de escola, Leonardo Ferreira da Silva, que possui um cargo efetivado e exerceu a função de designado entre 1999 e 2007. "Na nossa escola, temos, entre os efetivados, funcionários que possuem entre sete e 20 anos de serviços prestados. Há outros que já se aposentaram. Não sabemos o que pode acontecer em caso de uma decisão contrária à lei." O sentimento é compartilhado por outros docentes. "Já sofremos uma grande pressão dentro da escola, tanto das famílias quanto dos próprios alunos, que, em vários casos, têm uma base familiar desestruturada. Agora, essa novidade. Vivemos um verdadeiro terrorismo psicológico", desabafa o professor Renê de Oliveira, que antes da efetivação, prestou serviço como designado até 2004.
Além da ação judicial que ameaça seus vínculos, os profissionais também se dizem preocupados com o funcionamento da rede de ensino estadual. Segundo informações de servidores lotados na Escola Estadual Padre Frederico Vienkem, no Bairro Bonfim, entre 80% a 90% do quadro de pessoal da unidade é formado por efetivados. Os profissionais avaliam que existem outras escolas com realidades similares em Juiz de Fora. Em Minas Gerais, levando-se em consideração os 98 mil funcionários efetivados em 2007, eles responderiam por 41,5% dos cerca de 236 mil profissionais constantes na folha de pagamento da Secretaria de Educação no mês de setembro.
"Entendo que a lei veio para organizar as escolas estaduais, que não possuíam um quadro fixo de profissionais. A partir disso, as escolas mineiras apresentaram evolução nos índices de avaliação", avalia Renê. O entendimento de que a ação pode trazer transtornos para o sistema educacional é compartilhado pelo professor Leonardo. "Se todos estes profissionais forem exonerados de uma hora para outra, muitas escolas não terão condições de funcionar, tampouco de manter suas linhas pedagógicas."
Desde 2007
A controversa Lei Complementar 100/07 efetivou cerca de 98 mil designados em novembro de 2007. Segundo o Governo, a normatização foi criada com o intuito de regularizar a situação previdenciária desses trabalhadores, em sua maioria professores, especialistas, serventes e auxiliares de educação. Desde sua tramitação, a lei motiva discussões sobre sua legalidade. A Constituição de 1988 rege que o ingresso no serviço público deve acontecer somente por concurso, excetuando-se casos de contratações temporárias.
À época, a efetivação dos designados integrou um acordo de cerca de R$ 10 bilhões firmado entre o Governo e o Ministério da Previdência Social, para garantir a liberação do certificado de regularização previdenciária (CRP), emitido a cada três meses, que dá ao estado condições de firmar convênios e receber recursos da União. Com a costura, estes servidores foram absorvidos pelo Instituto de Previdência do Estado de Minas Gerais (Ipsemg).
Governo aguarda notificação
O Governo do Estado afirma que ainda não foi notificado sobre a ação que tramita no Supremo e aguarda com tranquilidade a decisão da Corte, esperando que os efeitos da lei sejam completamente mantidos. "A legislação corrigiu uma distorção que perdurava há mais de três décadas e atingia diretamente quase cem mil trabalhadores da Secretaria de Estado de Educação, grande parte composta por serventes escolares, que viviam a incerteza de ter o direito à aposentadoria garantido. Esse benefício, devido a todo trabalhador, não era reconhecido nem pela administração pública estadual, tampouco pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS)", diz o Executivo em nota.
A tranquilidade mostrada pelo Governo contrasta com os argumentos apresentados pelo procurador Roberto Gurgel, autor da Adin, baseada em parecer do procurador regional da República, Álvaro Ricardo de Souza Cruz. A alegação da Procuradoria é de que a lei desrespeita princípios públicos básicos como os da isonomia, impessoalidade e obrigatoriedade de concurso público, todos presentes na Constituição Federal. Para sustentar o pedido, Gurgel aponta precedentes em decisões do próprio STF, que declarou a inconstitucionalidade de normas do Rio Grande do Sul e do Distrito Federal que propunham medidas semelhantes. Como contra-argumento, o Executivo estadual afirma que "os servidores efetivados não adquiriram estabilidade, direito exclusivo dos funcionários aprovados em concurso público."
Sindicato defende concurso
A aparente tranquilidade do Governo e o posicionamento neutro do Sindicato Único dos Trabalhadores em Educação de Minas Gerais (Sind-UTE) preocupa os efetivados. "Muitos falam que a lei é inconstitucional, mas eles se esquecem dos benefícios trazidos por essa medida, que foi responsável por reduzir a rotatividade de professores dentro das escolas. Antes, muitos exerciam seus cargos de forma temporária e não criava identidade com alunos, pais e comunidade", afirma o professor Leonardo Ferreira da Silva.
Em nota, a coordenadora-geral do Sind-UTE, Beatriz Cerqueira, afirmou que o sindicato fará a defesa da categoria. "Por ser uma ação direta de inconstitucionalidade, a única possibilidade do sindicato atuar é como 'amicus curae', isto é, ser amigo da corte. Esta situação em que se encontram milhares de profissionais da educação da rede estadual é consequência da postura do Governo do estado que agiu de forma irresponsável ao propor uma lei que poderia ter a sua constitucionalidade questionada trazendo insegurança a tantas famílias mineiras."
Direito pleno
Representante do sindicato em Juiz de Fora, a professora Victória Mello, defendeu a realização de concurso público como porta de entrada para o funcionalismo público. "Esta é a nossa bandeira em todas as mobilizações. É isso que consta na Constituição e apenas isso é capaz de garantir direito pleno aos servidores. Estamos aguardando um desfecho, preocupados com a situação dos trabalhadores, inclusive daqueles que já se aposentaram com base nesta lei. Caso a decisão traga prejuízos para estes profissionais, aí sim podemos nos movimentar. Quanto a inconstitucionalidade, não há o que questionarmos."
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