Os poucos estudos existentes sobre o crack apontam o homicídio e o HIV como as maiores causas de morte entre usuários desta droga. Nesse ranking, os óbitos por overdose e outras causas têm assumido posições inferiores, conforme pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Mas isso não tira do crack o rótulo de ser uma das drogas mais perigosas ao organismo. Os efeitos do entorpecente foram acompanhados de perto pela família de C., morto há quase dois meses, aos 24 anos, com insuficiência hepática e respiratória, decorrente de uma hepatite C. A família não tem conhecimento de tudo o que o jovem fazia pelas ruas de Juiz de Fora, por isso não sabe se a doença foi contraída pelo compartilhamento de objetos contaminados ou por relação sexual, já que, a pedido de um traficante, o rapaz fez sexo em troca de pedras de crack. "O fato é que a droga o debilitou muito", diz a irmã.
A forma como a droga mudou a aparência do menino franzino, mas, até então, saudável, assustou os familiares. Dos 17 anos, quando começou a usar maconha e cocaína, aos 24, no auge do consumo de crack, o manequim do jovem baixou de 38 para 34. "Ele ficava muito tempo sem se alimentar. Mas, quando se alimentava, devorava tudo o que via pela frente. Já teve uma vez em que ele comeu tanto que acabou a comida, e ele passou a comer a ração do cachorro", conta a irmã.
Em pouco tempo, as implicações no cérebro ficaram evidentes. "Ele ficou cismado com as coisas, achando que tinha gente o vigiando o tempo todo, quebrava vidros do quarto, jogava copo na rua. Foi quando o internamos pela primeira vez", diz a mãe.
Fora os efeitos causados pelo consumo da droga, os dependentes de crack se sujeitam a situações extremas para conseguir o entorpecente, o que coloca a saúde ainda mais em risco. "Ele andava tanto pelas ruas em busca de dinheiro que abria feridas no pé. Isso porque não tinha mais tênis. Andava de chinelo ou descalço, sem camisa, no frio, na chuva", relata a mãe. "Quando morreu, ele só estava com dez camisas em casa. Nem roupa de frio tinha mais. Vendeu guarda-roupa, aparelho de som e até comida de casa", completa a irmã.
Conforme a psicóloga Franca Leone, especialista em tratar dependentes químicos, "o crack traz problemas sociais, e isso leva a doenças, pois muitos andam o dia inteiro no frio, na chuva, atrás das drogas, e acabam contraindo pneumonia, ficam desidratados e não se alimentam. Alguns ainda se prostituem em troca de crack e acabam ficando vulneráveis a doenças."
Não existe número padrão de experimentações para que uma pessoa se torne dependente. Mas, como o poder de dominar o sistema nervoso é grande, a recomendação de profissionais da saúde é que o cidadão mantenha-se longe do crack, nem mesmo chegando a experimentá-lo por curiosidade. "Eu defendo a tese de que, em um único uso, a pessoa corre o risco de ficar dependente."
Droga em debate na Câmara
A situação dos dependentes químicos será debatida hoje, às 15h, em audiência pública na Câmara Municipal. O presidente da Comissão Parlamentar Antidrogas, vereador Noraldino Júnior (PSC), adianta que um dos objetivos é, ao final do encontro, elaborar uma representação ao Governo federal, solicitando que Minas Gerais seja colocada entre as prioridades para receber investimentos previstos para combate e tratamento aos dependentes. "A realidade do crack é recente, e as clínicas de recuperação foram sendo criadas sem muito critério técnico, cada uma de uma forma diferente, muitas ligadas às igrejas. Queremos, dos órgãos competentes, a definição de critérios a serem estabelecidos para essas instituições de tratamento, buscando a eficácia no trabalho. Mas também não se pode exigir muito das clínicas e comunidades terapêuticas, pois elas já trabalham numa situação difícil. Então, é preciso que o governo dê suporte."
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