O tema da chefia – de que já tratei neste Blog (Chefia com Liderança e Disciplina Consciente) – adquire interesse especial na relação chefe-subordinado quando ocorre num quadro de natureza autocrática, em que o chefe não deseja ser autoritário. Trata-se de pessoa não escolhida pelos chefiados, que nada lhe delegaram, e que precisa conquistar legitimidade perante eles, além da legalidade institucional que possui. Caso típico do serviço público, das instituições militares e eclesiais, e das corporações empresariais, nos quais o chefe é escolhido pelos níveis superiores da organização, em tese devido a seus méritos.
Sempre me incitou curiosidade a diferença de qualidade entre os resultados obtidos em circunstâncias semelhantes por diferentes chefes, todos bons cumpridores das normas, dos manuais e dos regulamentos. Também me chama atenção uns obterem os mesmos resultados com mais facilidade e em menos tempo que outros. Por que a diversidade de efeitos e rendimento da ação de chefia?
Na atividade de planejamento, é fácil identificar atributos diferenciadores, como discernimento e objetividade. Porém, na execução, a fase do fazer acontecer, um quê quase intangível, que supera o poder de mando inerente aos cargos, distingue o modo de chefia mais eficaz. É o estilo pessoal de certos chefes exitosos, de sargentos menos graduados a oficiais no topo da hierarquia, que lhes permite obter dos comandados os comportamentos mais eficientes e duradouros. Eles têm um plus no trato com os subordinados, que conquista a adesão às orientações e ordens, e o comprometimento com as missões.
Algumas pessoas pretendem que a alternativa chefe ou líder dê os devidos nomes e contornos à distinção. É apenas parte da verdade e pode induzir ao erro de considerar chefia e liderança mutuamente excludentes, como se houvesse dicotomia. Resvalam em atribuir caráter pejorativo à palavra chefe (“Fulano é chefe…”), enquanto exaltam as características de um líder (“…mas Beltrano, esse é líder”). Tangenciam a injustiça de rebaixar as virtudes de ótimos chefes discretos que não galvanizam admirações, apesar da coesão e eficiência dos grupos que comandam. Superficialmente, rotulam os conceitos com os verbos empurrar (os subordinados), para chefia, e arrastar, para liderança. Mas boa chefia e liderança tanto arrastam pessoas quanto as empurram eficientemente.
Então, de onde surgem as diferenças de efeitos?
Tenente, comecei a compreender a profundidade do adágio que, ainda cadete, tantas vezes ouvira na Academia Militar: “A tropa é o espelho do chefe”. Depois, completei o entendimento, descobrindo a segunda parte do dito de origem francesa, adotado pelo Exército Brasileiro na década de 1930: “ (…) e sua mais severa juíza. Ela só deseja amá-lo e respeitá-lo”. Enfim, crer e confiar nele.
Percebi que os melhores chefes não viam na liderança um instrumento de projeção pessoal. Nem cada qual se via como o único capaz de conduzir bem as missões. Agiam como mais um membro da equipe. Isso influenciava e motivava os chefiados, que passavam a trabalhar como corresponsáveis pelos resultados. Formei a convicção de que liderança compõe necessariamente um processo de complementação e aperfeiçoamento da chefia. Concluí que as diferenças entre chefes e melhores chefes estão no vasto espectro de atitudes entre o exercício simples da chefia e o da chefia com liderança.
As distinções entre os dois tipos são encontradas no modo de fazer uso da autoridade, do poder, da persuasão e do exemplo no relacionamento com os subordinados. Algo muito além de “(co)mando e controle”.
Julgo cabível reiterar os conceitos expostos naquele artigo anterior:
Chefia é o exercício do dever institucional de empregar a autoridade e o poder do cargo para conduzir pessoas da melhor forma possível, visando ao atingimento de metas.
Chefia com liderança é o dever de chefia rematado pela disposição, capacidade e habilidade de influir sobre as vontades, a fim de conquistar o comprometimento das pessoas e conseguir que interiorizem atitudes que as predisponham continuadamente a comportamentos benéficos para a organização. É a “melhor forma possível”.
Eis a diferença de estilos: a chefia simples, mesmo quando não autoritária, escora-se na obediência devida e não no convencimento pleno. Já a chefia qualificada pela liderança é a parceirização de chefes e subordinados, obtida por meio da persuasão, do exemplo e de outros processos moralmente bons.
A chefia com liderança identifica pontes para o comprometimento nas vontades dos chefiados e no seu livre arbítrio. No compartilhamento do empenho e das iniciativas, com orientação do chefe, ela cria o caldo de cultura dos comportamentos mais eficazes e duradouros para o cumprimento das missões, não importando as circunstâncias.
Por aí passa a resposta para a perquirição da razão de ser da dissimilitude dos resultados. Estes, sua sustentação e a continuidade de comportamentos eficazes nas missões sucessivas materializam as virtudes da forma de chefiar com liderança. Bem como estabelecem um parâmetro que vem eliminando de vez o tipo de chefe monocrático, sabichão, isolado dos níveis mais baixos da execução, inatingível até mesmo pelo imaginário dos subordinados. Esse clichê está saindo de cena e cedendo lugar para o chefe que está junto e olha nos olhos, percebido como sendo um de nós pelas equipes de cogestão de uma estratégia ou de execução operacional, tática ou administrativa.
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